sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Tempo

Ultimamente, tudo se resume a tempo. Qualquer coisa que eu queira está dependente de tempo. 'Quando é que ele volta?' 'Dá-lhe tempo', respondem. 'Quando é que o cliente diz alguma coisa?' 'Dá-lhe tempo', respondem. 'Quando saem as notas?'  'Dá-lhe tempo', respondem. 

Já houve uma fase da minha vida em que passei pelo mesmo. Todas as perguntas que eu colocava tinham, invariavelmente, a mesma resposta: tempo. Nessa altura, odiei a palavra com todas as minhas forças. Eu não era (será que já sou?) uma pessoa paciente. Eu queria as coisas e queria logo. Esperar não era algo que eu soubesse fazer. Aprendi a fazê-lo nessa altura da minha vida. Aprendi a sentar-me no sofá a ler ou a ver um filme quando me apetecia pegar no telefone ou no carro e acelerar o desfecho das situações. Tornei-me uma pessoa mais paciente e cautelosa. Ainda hoje me surpreendo com a minha reacção a determinadas situações que noutras alturas me teriam levado a reacções irreflectidas e extemporâneas. Situações em que a maioria do mundo me pergunta como não perdi a cabeça e eu capaz de uma frieza incrível que, por muito difícil que seja de acreditar, me é fácil agora. A rapariga que entrava pelo departamento de literatura adentro como um furacão perante alguma injustiça já não vive aqui. Vive outra que não suportando a referida injustiça, já não age impulsivamente, urdindo um plano antes de adentrar o departamento. Lá dentro posso até me esquecer do calculismo e arguir a minha causa um pouco mais apaixonadamente do que seria expectável, mas o primeiro passo não é dado levianamente.

Excepto... Há sempre um mas, não é? Excepto quando me dizem 'Dá-lhe tempo'. Como o cão de Pavlov, ao ouvir essas frases, a rapariga impulsiva que hoje é mulher ponderada reage visceralmente e  sobrepõe-se a qualquer raciocínio e são precisas todas as minhas forças para a convencer - como a convenceram há tantos anos - a sentar-se no sofá e esperar em vez de agir. É preciso recordar-lhe todas a situações que a sua precipitação levou a fracassos irremediáveis. É preciso lembrar-lhe o Sweet November, a Enya, para que ela se sente e volte a interiorizar que não podemos perder o tempo mas também não podemos apressá-lo. Lembrá-la que há alturas para dar um murro na mesa e gritar e marcar a nossa posição, mas também há alturas de fincar as unhas na palma das mãos até a dor nos impedir de agir. Lembrá-la que, por vezes, o ditado antigo é verdadeiro e o tempo é mesmo o melhor remédio. 

E enquanto a mulher ponderada de hoje discute com a rapariga impulsiva de outrora, eu vejo a minha vida como se estivesse num casino. Na minha frente, uma mesa de jogo. Atrás de mim, a porta para a rua. Na minha mão, um monte de fichas. "Há dois monstros dentro de nós..." 

4 comentários:

Rosa Negra disse...

(sorriso)

Mae Frenética disse...

Só dois?

Iceberg disse...

Fren, assim, de repente, só me lembro de 2 mas, de certeza, que tenho mais. Muitos mais...

Iceberg disse...

:)